25 de set. de 2008

Boceje



De frente a uma lanchonete conhecida e movimentada, eu observava o ambiente. O local ainda estava vazio no começo do expediente. Lá dentro os funcionários aguardavam a clientela. Estava displicente enquanto o sinal do cruzamento não abria, quando ele passou. Começou com o funcionário lá da ponta que bocejou e entrou. Em seguida, o outro que estava mais próximo, bocejou sem dar muita importância pro que estava acontecendo. O que estava na outra ponta da saída, e mais próximo de mim, também bocejou e, por fim, bocejei.

O bocejo passou e ninguém deu a mínima. Mas pra onde será que ele foi? Naquela hora resolvi segui-lo, em vão. Era tarde demais, passou tão rápido que não deixou qualquer vestígio senão o de nós quatro boquiabertos bocejando. Acredito que seguiu o seu caminho rotineiro daquela hora. Talvez, todos os dias, naquela mesma hora, o bocejo passe lembrando àqueles funcionários que é hora do bocejo. Suponho mais, que o bocejo passe trazendo alguma mensagem, de algum lugar por onde tenha passado.

Não vejo no bocejo coisas más. As mensagens que me refiro devem ser de paz, pois quando se boceja se acalma, nem que seja por alguns segundos.

O bocejo pode fazer mais por nós. Talvez ele seja mal aproveitado, ou subutilizado.

O bocejo aparece, por pelo menos, três vezes ao dia. Pela manhã quando se acorda, depois do almoço antes do cochilo e a noite. Acredito que ainda dê uma passadinha na madrugada, trazendo as primeiras (ou últimas) notícias do dia para os noturnos.

Ah, se soubéssemos o valor de um bocejo.

Na idade média, por exemplo, quando os maridos largavam suas donzelas e filhos em casa e passavam longas datas em batalhas deixando todos aflitos e sem esperanças, todos já bocejavam.

- Mãe, acorda! Está vindo o bocejo.

E a esposa saudosa se aprontava correndo ansiosa pelo bocejo do norte, onde estava seu par, que lhe traria a calma para suportar momentos dolorosos de guerras sem fim.

O bocejo é um momento de pausa, de reflexão. Não se faz outra coisa enquanto se boceja que não seja o próprio ato de bocejar. Em uma discussão, por exemplo, no momento mais quente da briga, o bocejo surge como um apaziguador. Nada como um grande e demorado bocejo para se arrepender, esfriar a cabeça e ver que realmente não vale a pena tudo aquilo.

Claro que às vezes um bocejo fora de hora pode nos deixar sem graça. Nada mais desconcertante que bocejar enquanto lhe perguntam o que achou da palestra que acabou de terminar.

Fora isso, o bocejo é bom. Diminui as diferenças. Todos bocejam, desde os mais pobres aos mais ricos. Brancos e negros bocejam. Os chineses bocejam. Ele não distingue credo ou sexo. Até mesmo os mais velhinhos se deliciam nessa passageira calmaria.

Aposto um mirréu que você não termina esse texto sem bocejar.

Boceje! Não deixe que ele passe por você despercebido. Escute o que ele tem pra te contar. Ou boceje por um instante de calma, apenas.