31 de jan. de 2012




A poucos minutos da água chegar, o último ônibus partira deixando apenas os dois para trás. Em breve, a cidade inteira estaria inundada.

A decisão de ficar foi conjunta. Ali era o único lugar onde os dois se sentiam felizes de verdade. Não conseguiam imaginar a felicidade morando em outro endereço. Foi ali que se conheceram e se amaram por todos os dias seguintes.

Talvez fosse o medo de perder um amor construído naquele lugar. Medo de não conseguir carregá-lo na mudança. Pra eles, parecia que o amor tinha casa e também portão.

A água chegou mansa. A rua de pedras começou a se encharcar. Em poucas horas, a água cobriu-lhes o peito. Ela o abraçou bem forte. Com um dos braços, ele a agarrou pelas costas enquanto segurava tensamente com o outro as grades de aço do portão da casa dela. Aquele mesmo portão onde se encontravam todos os dias, em hora marcada, às vistas do pai. Um portão que, agora, estava inundado também pelas águas da nova represa.

Em poucos segundos, a água cobriu-lhes o rosto. Alguns minutos de angústia deram lugar a uma cena de mais profunda calma. Debaixo d’água e em frente à velha casa, paralisados como numa fotografia antiga do primeiro encontro, os dois selaram o amor no mais longo e molhado beijo de todos que já haviam dado.