22 de fev. de 2010

O Menino, o Vampiro e o Pescoço

Tinha certeza que era só sonho. Um grande sonho. O que mais podia querer um menino de 12 anos, cheio de coisas a descobrir e tão dependente de tudo e de todos, além de liberdade e poderes? No seu sonho, era vampiro. Podia voar, podia correr tão rápido quanto pudesse imaginar. Tinha forças extraordinárias. Chupava os pescoços de donzelas, transformando-as em suas eternas admiradoras.

Acordou com um pressentimento estranho. Na verdade, era uma idéia fixa que não parecia ser só sua. No sonho, se transformara em vampiro quando, no recreio da escola, como de costume, a pedra que alguém arremessava pra cima tocava o chão, anunciando o começo da brincadeira. Apesar da descrença, era criança e, mais que isso, era um grande sonhador. Resolveu acreditar que aquilo fazia sentido e que deveria aguardar a pedra cair novamente para alguma coisa acontecer.

A primeira parte demorou a acabar. As aulas pareciam intermináveis, até a sirene tocar, anunciando o intervalo. Todos correram pro pátio. Uns ansiosos para a brincadeira, outros famintos. A correria, normalmente, começava no meio do intervalo, quando alguns já haviam se alimentado. Estava nervoso, porém quieto. Observava detalhadamente cada rosto ali presente. Também tinha um amor de criança. Ela estava logo à sua frente, onde sempre ficava nos recreios, junto às suas amigas. Ela também gostava dele. Os dois trocaram um olhar, bem rápido, mas significativo.

Sabia que a hora estava chegando. Alguns já haviam anunciado o começo da brincadeira em breve.  Aproximou-se do grupo, ainda quieto, diferentemente dos outros dias. Esperou. Logo todos se reuniram. Quem jogava a pedra era o pegador da vez. Esse tinha que pegar todos que corressem. A brincadeira acabava quando todos eram pegos. O pegador foi anunciado. A pedra já estava em sua mão. Num instante, sem esperar qualquer outro anúncio, um garoto jogou a pedra pra cima.

Aquele momento demorou a passar. A pedra, próxima ao chão, parecia ter percorrido um caminho maior do que de costume. Talvez tenha sido a força do garoto que a jogou, ou a ansiosidade, maior do que pudesse imaginar. A pedra caiu. Ele parou. Ficou ali empedrado por vários segundos até perceber que nada tinha acontecido. Num instante, sua feição séria e nervosa se transformara em tristeza e desolação. De cabeça baixa, ficou por mais alguns segundos.

Sentiu a proximidade de alguém. De repente estava sendo abraçado por uma menina. Era ela, a sua pequena amada. De longe, ela o observara. Havia percebido a mudança repentina e a tristeza que tomava conta do seu garoto. Por isso resolveu abraçá-lo. Sem saber o que fazer, aos poucos, ele retribui o abraço. O aperto ficou ainda mais forte e mais sincero. Então, ele começou a chorar. Agora, sem saber se era por desilusão ou por paixão. Chorou. Ela também o abraçou mais forte.

Ali, parado por quase um minuto naquele aperto bom, sem saber o que mais fazer, avistou o pescoço liso da menina que o abraçava. Estava próximo da sua boca. Sem pensar, mordeu-o. Não usou a força. Pelo contrário, foi quase um beijo. Ela mesma, nem percebeu. Se percebeu, gostou. Ele adorou. Mordeu e voltou a abraçá-la, agora com um sorriso escondido no canto da boca, como um vampiro que sorri após sugar sua presa. Foi aí que entendeu que pra ser vampiro não precisava aprender a voar assim, de um dia pro outro. Podia começar devagar, só mordendo os pescoços das donzelas. Nessa história, até se arrependeu um pouco de não ter feito isso antes da pedra cair.

5 comentários:

Anônimo disse...

Vc está me saindo um cronista de primeira! Desse jeito vai virar vampiro(?) rapidinho...

Abraço camarada!

Lucão disse...

hehehe
Valeu, Fouad!
ser vampiro como o garoto aí nem é tão mal, é? rs

Helena Chiarello disse...

Caramba, caramba, caramba!
Que beleza, Lucão!
Envolvente a ponto de permitir quase "ouvir" os pensamentos do protagonista.
Intrigante e irretocável, com um toque de suspense que se transforma em deliciosa surpresa, tanto pelo enredo como pelo desfecho.
Perfeita a pitadinha de romantismo e sensualidade do final.
Gostei demais!
Grande abraço!

Vera Celms disse...

Lucão, meu filhote, essa marca que fica no pescoço depois desse carinho, no intervalo da escola, na minha época tinha outro nome... não era mordida de vampiro... adorei... PARABENS FILHOTE... beijos

Lucão disse...

hehehehe essa marca foi puro eufemismo, Verinha! :)
Obrigado! "Bão" que vc achou "bão".
beijos